Consumidor : entram em vigor as novas regras do cheque especial

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Entraram em vigor no domingo (1º.07.18) as novas regras para uso cheque especial modalidade de crédito rotativo, vinculada diretamente à conta-corrente do usuário, sem necessidade de garantia. As medidas, elaboradas pelo conselho de autorregulação da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), determinam a oferta de alternativas para o pagamento do saldo devedor com possível juro menor ou condição mais vantajosas
Juro altíssimo
Os bancos orientam que o serviço seja usado somente em situações excepcionais e por pouco tempo, já que os juros cobrados são, muito mais altos. Em maio, segundo o Banco Central (BC), a taxa média de juros do cheque especial chegou a 311,9% ao ano. É quase 48 vezes maior do que a taxa básica de juros, a Selic, atualmente em 6,5% ao ano e que serve de referência as demais taxas praticadas no mercado.
Mudanças
Uma das principais medidas que entram em vigor é a oferta automática de parcelamento para consumidores que usaram mais de 15% do limite disponível por 30 dias consecutivos. A oferta será feita nos canais de relacionamento e o cliente decide se adere à proposta. Caso não aceite, um novo contato deverá ser feito a cada 30 dias.
Caso o consumidor opte pelo parcelamento do saldo devedor, os bancos poderão manter os limites de crédito contratados, levando em consideração as condições de crédito do cliente, ou estabelecer novas condições para a utilização e o pagamento do valor correspondente ao limite ainda não utilizado e que não tenha sido objeto do parcelamento, informou a Febraban.
Os bancos também vão usar os canais de relacionamento com o cliente, como internet e telefone, para alertar o consumidor toda vez que ele entrar no cheque especial. No alerta, os bancos deverão informar que esse crédito deve ser utilizado em situações emergenciais e temporárias.
Nos extratos bancários dos clientes, o saldo em conta será informado de forma separada do saldo e do limite do cheque especial, para que o usuário do serviço não confunda o valor do crédito como sendo saldo positivo da própria conta.
Pelas novas regras, as instituições financeiras terão sempre disponíveis ao consumidor uma alternativa para parcelamento do saldo devedor do cheque especial.
As mudanças no cheque especial, tomada por iniciativa dos próprios bancos, ocorre exatamente um mês depois da entrada em vigor da resolução do Conselho Monetário Nacional (CMN) que limitou e padronizou a cobrança de taxa de juros do rotativo cartão de crédito, que também é uma das mais altas do mercado.
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Mudanças no cheque especial não resolvem alto custo do crédito
Com a entrada em vigor das novas regras para o uso cheque especial, a expectativa dos bancos é evitar o superendividamento de clientes do serviço e reduzir a inadimplência. Para especialistas as medidas não atacam o problema estrutural do alto custo do crédito no país. Apenas garante ao banco formas de cobrar a divida gerada pelos clientes.
“A questão central não está sendo atacada, uma vez que os juros do cheque especial, quando comparados com os juros da própria economia [taxa Selic] são extremamente elevados”, afirma o economista Gilberto Braga, professor de finanças do Ibmec e da Fundação Dom Cabral.
“Me explica como é que você cobra mais de 20% de juros ao mês, se a taxa Selic está em 6,5% ao ano? Os bancos cobram mais em um mês do que a taxa de referência em um ano. Nada justifica, e nenhum país do mundo faz isso”, questiona Newton Marques, professor licenciado de economia da Universidade de Brasília (UnB) e membro do Conselho Regional de Economia do Distrito Federal.
Para Gilberto Braga, professor do Ibmec, essas iniciativas devem ajudar os clientes bancários em dificuldades, mas também terão impacto positivo na lucratividade do sistema financeiro. “Quando o banco propõe um mecanismo de controle como esse, ele mitiga os riscos de recebimento, mas também fideliza o cliente em uma operação de longo prazo. Ajuda o cliente, mas também ajuda o banco”, diz.
Segundo Gilberto Braga, numa economia caracterizada pela extrema desigualdade social e de distribuição de renda, o crédito é um elemento fundamental para o desenvolvimento, sobretudo para a população mais pobre e a classe média. Para diminuir os juros do cheque especial, ele sugere taxas personalizadas para cada cliente, o que beneficiaria os bons pagadores.
“O custo do crédito é caro mesmo para quem paga em dia. Essas taxas de juros do cheque especial poderiam ser livremente negociadas entre o cliente e o banco, a partir de padrões de risco específicos, por meio da análise do perfil individual, assim como fazem as seguradores de automóvel ao calcularem o valor da apólice, levando em consideração os hábitos de direção do cliente”, explica.
Para Newton Marques, a alta concentração do sistema bancário no país também dificulta uma redução efetiva nas taxas cobradas. “Além de uma ação mais efetiva do Banco Central em cima das escorchantes taxas de juros, seria fundamental abrir o mercado para a concorrência no setor de crédito, aí eu queria ver os bancos cobrarem tão caro para emprestar”, argumenta.
Visão da Febraban
A Federação Brasileira dos Bancos (Febraban) explica que o cheque especial funciona como uma reserva que o cliente pode usar no caso de uma emergência e de um gasto inesperado, sem precisar recorrer ao banco, já que a linha está pré-aprovada. “Justamente por causa dessas caraterísticas os juros são mais elevados em comparação a linhas de mais longo prazo”, informa a entidade.
Educação financeira
Os economistas destacam a falta de uma política de educação financeira que comece desde cedo. Mesmo as novas regras para o cheque especial, segundo eles, não estabelecem medidas concretas nessa direção. “A pessoa que está devendo o cheque especial, em geral, já está em descontrole financeiro e perdeu a capacidade de pagamento. Poderia haver uma exigência sobre quem pretende tomar crédito de fazer um treinamento em educação financeira, como acontece com o motorista que tem a CNH suspenda e precisa fazer um curso de reciclagem para volta a dirigir”, defende Newton Marques, professor da UnB.
Para o economista Gilberto Braga, o ponto de partida deveria ser a própria escola: “É fundamental introduzir a educação financeira no currículo geral do ensino do país. Há muitas pessoas com curso superior, bem formadas, que não sabem fazer uma regra de três ou calcular um juro simples, coisas absolutamente indispensáveis em uma sociedade mediada pelo dinheiro”.
Por Pedro Rafael Vilela – Repórter da Agência Brasil